Baixe aqui TREMOR ESSENCIAL. Para ouvir o disco e conhecer o encarte, clique aqui.

 

Na mangueira o Rio é mais baiano.  Em Celso Sim, São Paulo é mais Oswaldiano.

uma apresentação, por João Chauí

O  maior mestre modernista Brasileiro, num último e derradeiro episódio público, participa de uma entrevista na recém criada TV Record. Terminado o programa de 20 minutos, acontece um gesto repentino que Paulo Machado de Carvalho não se atreve a tirar do ar: Oswald de Andrade, um mês antes de morrer, declama Soidão ao vivo para São Paulo. 13 anos após sua morte e 30 anos depois de um esquecimento a que é submetido ainda vivo, enfim o gênio de Oswald e sua obra finalmente são resgatados por críticos como os irmãos Campos, pelo Teatro Oficina e pela Tropicália. Ele mesmo escreveu: “considero minha obra acima da compreensão brasileira”. Não era fácil fazer o povo consumir em escala seus maravilhosos biscoitos, como pretendera um dia. Desde então, a música brasileira moderna tem se servido dessa produção, mesmo que muitas vezes a obra de Oswald de Andrade permaneça soterrada sob a superficialidade a que muitas vezes é submetido o conceito de antropofagia, neutralizando-o, deixando a sua obra mais uma vez acima da compreensão brasileira.

Celso Sim, desde os tempos em que compunha e cantava no Teatro Oficina, (esse teatro oficina que nunca deixou de ser antropofágico e nunca deixou de ser contemporâneo, assim como celso Sim) canta Oswald, o matriarcado de pindorama, a revolução da língua e da poesia.  Mas faz isso sem a pasteurização da ideia da antropofagia na nossa música e também na nossa cultura. Resgata a medula e o osso da geléia geral. Só doido pra não gostar de Soidão com Celso, Lepetit e Gigante Brasil na percussão. Para Antonio Candido, clássico é o que “possui a virtude de descrever diretamente os atos e os fatos sem os tornar prosaicos”. Celso Sim não é moderninho e não torna prosaica a obra e as idéias de Oswald. Celso Sim é clássico e sabe exatamente o que está cantando. Nada mais moderno.

Em seu mais recente trabalho, Tremor essencial,  a faixa tupitech traz o legado antropofágico no título e no DNA, lembrando que “comer gente sempre foi diversão levada a sério/ a gente come mais gente que terra de cemitério” A letra do Xico Sá diz ainda: “É o sampler ao infinito desde o primeiro caeté”.  Mas o sampler se faz renovado e a letra sugere uma desmistificação do conceito de ser brasileiro. É antropofagia ventilada, revigorada e potencializada.

Evocação Moderna, uma parceria entre Celso Sim e André stolarski,  resgata de maneira mais abrangente o movimento modernista brasileiro desde as entranhas da música, cujo arranjo começa entoando um estilizado canto indígena, primitivismo que foi evocado pelo  nosso modernismo, que por sua vez evocou as vanguardas européias e finalmente, numa espiral, ouvimos surgir da letra os principais nomes modernistas, os quais, cantados por Celso, nos remetem a uma estranheza de língua a que os evocados e o cantor ainda nos são capazes de provocar. Uma provocação que é típica de quem sabe criar.

Na primeira faixa do disco que dá nome ao Álbum, Tremor Essencial marca o ritmo forte de um abalo que dissolve em nós os nossos nós profundos.  Desatar esses nós mais profundos foi tarefa da Bossa Nova como uma espécie de linha evolutiva da moderna música brasileira e Tremor Essencial deixa escapar de seu sismo o Saudosismo de Caetano. Como dois quadradões.  Mas chega de saudade. A música Um Fio é seqüência lógica dessa linha evolutiva, através da poesia de Arnaldo Antunes em arranjo de iê iê iê revisitado.

O legado moderno de resgate como meio de evolução está presente nos Orikis de Yemanjá e de Jorge, em parceria com Antonio Riserio.

O funk erótico filosófico de A liberdade é bonita mas não é infinita, letra de Jorge Mautner, faz parte dessa erupção sonora que transforma o disco em celebração da tradição de fundir música e poesia. Coisa de brasileiro, de índio, de branco e de preto, pangeia que virou geleia.

Tremor essencial é abalo sísmico, fenda que deixa e(s)coar a nossa mais bacana música popular brasileira. Resgate e evolução. Sempre.

 

TREMOR ESSENCIAL

No novo cd de Celso Sim, parcerias inéditas do compositor e cantor com Arnaldo Antunes, Antonio Risério, Xico Sá, Cacá Machado e Pepê Mata Machado, entre outros – além da parceria, inédita em disco, de José Miguel Wisnik e Jorge Mautner “A liberdade é bonita”, cantada no CD por Elza Soares e Celso Sim.

Depois dos elogiados cds Celso Sim, vamos logo sem paredes! (2008), e Pra que Chorar (2010, Biscoito Fino) com Arthur Nestrovski, o cantor e compositor lança este Tremor Essencial, com uma sonoridade rock’n roll em atitude, violência, humor e amor, com guitarras, baterias e baixos potentes, visitando da balada pop ao ijexá, da morna caboverdiana ao tecnobrega, do canção de ninar ao funk.

Tremor Essencial, é um CD de 12 canções com produção musical de Guilherme Kastrup e Estevan Sinkovitz, mais os instrumentistas Rodrigo Campos – autor e co-autor dos cds (São Mateus não é um lugar assim tão longe, Bahia fantástica, Passo torto), Ricardo Prado e Pepê Mata Machado, o coletivo de criação musical tupi essencial; participações especiais de Elza Soares, voz, e de Guilherme Calzavara, arranjos de trompete e de voz. Kastrup produziu os cds dos artistas Zeca Baleiro, Cacá Machado, Márcia Castro e Chico Salém, além de estar lançando seu primeiro trabalho autoral, Kastrupismo.

O Cd tremor essencial é uma parceria entre a Circus Produções Fonográficas de Guto Ruocco e o selo Sem Paredes, com projeto gráfico do arquiteto Rodrigo Cerviño, fotos de Gal Oppido e de Tuca Vieira.

FacebookTwitterGoogle+EmailPinterest